"Hoje eu percebi que venho me apegando às coisas velhas. O que é isso, meu amor?
Será que eu vou virar bolor?"
Bolor - Arnaldo Baptista
Minha avó tem mania de
guardar coisas velhas. Um prato de plástico que já está trincado, uma poltrona de
um antigo estofado que fica ali no canto de um dos quartos, uma colher (de nem
sei que ano) que destoa das demais peças do faqueiro, uma taça de vinho que fica
escondida no armário sem uso para fins etílicos.
Uma
vez questionei o porquê de tantas coisas velhas, detalhes não jogados fora, do
armário de madeira pintado (e desbotado) de vermelho, da antiga máquina de
costura e da lamparina pendurada no alto da parede. Por que tanta coisa
acumulada e sem uso? Por que essa velharia de um canto a outro da casa que
também é antiga? Por que, hein vó?
Ela serenamente olhou e falou sobre uma das peças: "Sabe essa panela
que está no fogão? Eu ganhei do seu tio mais velho quando ele tinha 15
anos. Ela tem material bom, não é como as outras. Ela 'atura' muito
mais".
Foi
nessa hora que entendi que apesar de ganhar tantos outros conjuntos de panelas, estas foram mais descartáveis que úteis. Foi ai
que eu pude recordar que ela se emociona chora mais quando uma xícara que ela
tem há mais de 20 anos quebra, do que quando ganha outras seis novas. Que ela
usa sempre as mesmas toalhas de mesa, mesmo tendo trocado de mesa várias
vezes. Que a ordem dos elementos da casa sofrera poucas alterações ao longo dos anos.
Foi
deste modo simples que reparei que o que é bom dura, o que é de qualidade resiste
e o que é humilde, mantem-se humilde.
No alto
de 73 anos, aquela senhorinha fez com que eu prestasse atenção nestes detalhes
tão importantes pra ela, tanto que isso me renderia muito mais que uma
reflexão, me renderia uma lição.
Ela continua guardando coisas velhas e mesmo achando que eu não
seja tão boa pessoa, apesar de ter comigo todos os valores dela, apoio esse
direito de segurar com todas as forças as velhas coisas que a fazem bem.
Deve ser por isso que ela tem me mantido em casa também. Deve ser...
@gi_cabral
é velha mas adora coisas novas também. Saudosista e fiel a recordações que ninguém entende.
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